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segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Pataias: "o estrangeiro"

18 de Janeiro de 1934.

É provavelmente a data mais emblemática da história da Marinha Grande, e até do movimento sindicalista português.

A revolta vidreira na Marinha Grande acabou por ter reflexos, também, na história de Pataias.

Em 1934, Pataias fervilhava com quase meia centena de fornos de cal e duas grandes fábricas de vidro: a Fábrica de Vidros de Pataias e a Empresa Vidreira de Pataias. O movimento de operários e mestres vidreiros era uma prática comum e frequente entre as fábricas de Pataias e as sediadas na Marinha Grande.

Com a revolta vidreira na Marinha Grande, foram colocadas restrições à livre circulação dos vidreiros, nomeadamente aqueles que possuíam ligações aos sindicatos. Assim, as forças policiais passaram a controlar e limitar os movimentos dos mesmos. Foram criados licenças de trabalho, rapidamente popularizadas por “passaportes”, apenas entregues a uma parte dos trabalhadores (sem ligações aos sindicatos), que lhes permitiam trabalhar livremente quer em Pataias, quer na Marinha Grande. Aos trabalhadores que os não possuíam, essa circulação entre as fábricas, para cumprir as “campanhas”, estava vedada, sendo obrigados a permanecer na mesma fábrica ou a procurar outro trabalho quando as fábricas de vidro diminuíam a produção.

Não esquecer ainda que durante os anos de 1930, o atraso económico e social do país era enorme, baseado numa actividade e prática agrícola de cariz tradicional e baixíssima produção, rendimento e produtividade, assente numa mão-de-obra desqualificada e analfabeta. O emprego na indústria representava uma subida do nível de vida de três ou quatro vezes.

Pataias e Marinha Grande eram assim importantes destinos dos movimentos migratórios internos, devido ao trabalho nas fábricas de vidro e subsidiárias, como as empalhações (e mais tarde de cimento, na Maceira e em Pataias), claramente remunerado acima da média.

Uma das características de grande parte do emprego à altura era o facto de este ser sazonal. Assim, os trabalhadores vinham para as fábricas de vidro cumprir campanhas de dois, três, quatro meses. Quando voltavam às suas terras, levavam o resultado de quase um ano de trabalho caso tivessem ficado na agricultura. Este facto, aliado à necessidade da licença de trabalho, o tal “passaporte” para circular entre as muitas fábricas da Marinha Grande e de Pataias, fazia com que muitos trabalhadores quando se referiam a Pataias, o fizessem por “Estrangeiro”.

Ou seja, vir trabalhar para Pataias significava não só um rendimento acima da média como ainda era necessário um passaporte (licença de trabalho). Tal e qual como quem ia para o estrangeiro.

Daí a designação de “Pataias = Estrangeiro”.

Nota de roda-pé
O que escrevi é o resultado de um conjunto de conversas, histórias orais, comentários, e-mails e um pouco de investigação, realizados após o apelo que aqui deixei.
Agradeço a todos os que tornaram este texto possível.

3 comentários:

  1. Ora aqui está mais uma para a nossa história. De certeza que não és tu que vais receber os 25 mil? por aquilo que aqui vais escrevendo e por aquilo que fizeste no paredesdavitoria.com mereces mais que outros.mas como não és da cor...

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  2. Mais um pedaço de Pataias com história. Diz-que no auge dessas extraordinárias lutas, os trabalhadores que fizeram as greves tiveram que andar escondidos, e que nem a casa podiam ir, apenas as suas mulheres sabiam do seu paradeiro, sendo estas que lhes levavam a comida às escondidas, isto durou meses e em alguns casos anos. Muitos destes tinham filhos e só com a mãe, as dificuldades eram enormes. Cresceram e fizeram-se homens e mulheres, mas nesses tempos dificeis todas as semanas lhes era deixado à porta sacos com comida,pela calada da noite (batatas couves carne... e até dinheiro) por aqueles que eram os fura greves os medrosos os reacionários..., os que tinham ficado a trabalhar. Para todos esses HOMENS vidreiros o meu bem Hajam.

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